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Desrespeito sofrido por prostitutas é múltiplo e constante

O trabalho conclui que experiências de humilhação em países de modernidade periférica, como o Brasil, são mais complexas que em países menos desiguais.

Por Camila Sousa

As condições sociais em que nos inserimos, na maioria das vezes, podem funcionar como propulsoras daquilo que nos tornamos. No entanto, tais condições são distribuídas desigualmente na sociedade e alguns grupos, devido a um longo processo histórico de desrespeito social, ocupam um lugar de subcidadania. De acordo com os relatos colhidos pela dissertação produzida por Vitor Tavares Bahia, no Programa de Pós Graduação em Sociologia da UFPE (PPGS), intitulada “Desrespeito moral, afetividade e luta por reconhecimento: a vida de prostitutas da cidade do Recife”, a prostituição ainda é vista na opinião pública como uma “atividade humana desprezível, que só é praticada por pessoas ‘vagabundas’ que escolheram não estudar ou por pessoas miseráveis que, ao longo da vida, só tiveram uma única opção de sobrevivência”.

O trabalho conclui que experiências de humilhação em países de modernidade periférica, como o Brasil, são mais complexas que em países menos desiguais. Para Vitor Bahia, “na realidade social brasileira, a separação entre o respeito jurídico/impessoal e o respeito de estima social/pessoal acontece apenas num plano institucional/formal e não necessariamente na vida prática das pessoas”. Nesse sentido, segundo o autor, por uma fraca institucionalização do respeito como valor social indispensável para a vida pública e privada, as experiências de desrespeito são mais comuns e constantes, rebatendo mais fortemente em grupos subalternizados, como é o caso de grande parte das mulheres profissionais do sexo.

Entretanto, os achados da pesquisa indicam uma explicação mais complexa. Por um lado, o relato das prostitutas entrevistadas mostra uma diversidade de trajetórias de vida que não se encaixam nessa avaliação simplista e dicotômica da realidade social. Por outro lado, esclarece Vitor, o que há em comum nos relatos é que o desrespeito não é uma experiência de vida inédita, mas sim uma constante na vida dessas pessoas, o que o autor veio a chamar de “desrespeito como modo de vida”.

NARRATIVAS | O pesquisador abordou um panorama geral dos territórios de prostituição no Recife, a partir de um levantamento quantitativo do perfil social das prostitutas e, por meio do levantamento de narrativas bibliográficas, prospectou as histórias de vida dessas mulheres. A partir de uma abordagem qualitativa, tanto as categorias analíticas quanto os métodos utilizados procuraram compreender como as experiências de desrespeito moral influenciam nas vidas das prostitutas investigadas e de que maneira as condições mais objetivas das relações de reconhecimento influenciam nas experiências de desrespeito moral.

Como relata o autor da pesquisa, Vitor Bahia, “a notícia da morte de uma amiga é morna. As agressões e chantagens da polícia são mornas. O estupro sofrido há dois dias é morno. A extorsão dos donos da rua (homens que cobram para garantir a segurança das prostitutas) é morna”. Estas situações de não reconhecimento representam, para as mulheres entrevistadas, apenas mais um capítulo de uma vida sofrida, desumanizada por uma sociedade desigual e violenta, pois as coisas “são assim mesmo”, como o curso natural da vida. 

O objetivo da dissertação, cuja produção contou com a orientação do professor Paulo Henrique Martins, do Departamento de Sociologia e do PPGS da UFPE,  foi investigar as experiências de desrespeito moral nas histórias de vida das prostitutas, a fim de compreender como elas lidam e se percebem como participantes deste cenário. Um ponto de conflito constatado por Vitor é o discurso quase tornado oficial a respeito das mulheres que trabalham no mercado do sexo: “Seja caracterizada como uma vida fácil, como se as prostitutas tivessem escolhido o caminho mais rápido para ganhar dinheiro, ou como uma opressão social, de modo a enxergá-las como mulheres que não tiveram escolhas e que só podem sair dessa vida com a ajuda de outrem”.

Mais informações
Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFPE
(81) 2126.8285 | 2126.8284
ppgs.ufpe@gmail.com

Vitor Tavares Bahia
vitorrtb@gmail.com

Data da última modificação: 11/09/2018, 15:37