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“O Brasil, nem qualquer lugar do mundo, terá vacina até o final de 2020”, afirma Sérgio Rezende
Uma das vozes mais importantes no combate ao coronavírus no Nordeste, ex-ministro da Ciência e Tecnologia mantém expectativas baixas sobre conquista da imunidade coletiva à curto prazo no país e pede cautela em projeções otimistas.
Prof. Sérgio Rezende, ex-ministro da C&T e atual coordenador do Comitê Científico de Combate ao Coronavírus no Nordeste (cargo ocupado juntamente com o neurocientista Miguel Nicolelis).
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Prof. Sérgio Rezende, ex-ministro da C&T e atual coordenador do Comitê Científico de Combate ao Coronavírus no Nordeste (cargo ocupado juntamente com o neurocientista Miguel Nicolelis).
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Projeto Covid-19 e a Matemática das Epidemias - Fazendo a Ponte entre Ciência e Sociedade
Redação: Camila Sousa e Júlia Lyra
Coordenação: Felipe Wergete Cruz
Muitas dúvidas e, ainda, poucas respostas. Passados quase seis meses desde que a pandemia de Covid-19 se instalou no Brasil, onde já vitimou fatalmente quase 130 mil vidas e atingiu mais de 4 milhões de pessoas, ainda não há previsão de quando a antiga normalidade - tão aguardada - voltará a se restabelecer.
Na tentativa de dar luz a estas questões, o projeto Covid-19 e a Matemática das Epidemias - Fazendo a Ponte entre Ciência e Sociedade - entrevistou Sérgio Machado Rezende, ex-ministro da Ciência e Tecnologia (2005-2011) e atual coordenador, juntamente com o neurocientista Miguel Nicolelis, do Comitê Científico de Combate ao Coronavírus no Nordeste, para avaliar os impactos causados nas universidades públicas pela gestão do governo federal e as projeções da doença no país, na Região e em Pernambuco.
OBSERVATÓRIO) Nos últimos anos tanto a educação quanto o setor de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) sofreu cortes bastante expressivos pelo governo federal. Isso têm dificultado o poder de resposta das universidades e instituições de pesquisa no combate à pandemia? Que estratégias elas têm usado para driblar essa crise?
Sérgio Rezende (S.R): - O corte de verbas do governo federal tem dificultado, certamente, a resposta das universidades e instituições de pesquisa. Mas, felizmente, elas estão trabalhando com muita disposição, trazendo muitas informações, muitas novidades para a sociedade brasileira, apesar disso. E uma das das razões é que nos últimos 15 anos foram feitos muitos investimentos nas universidades e centros de pesquisa. Os investimentos feitos nas instituições de saúde como a Fiocruz foram muito grandes. As universidades estão com equipamentos modernos e estão conseguindo se engajar nesse desafio do Brasil no momento, que é enfrentar a pandemia numa época em que o governo federal abandonou completamente a coordenação do combate à pandemia. Portanto, os cortes estão prejudicando, mas ainda não paralisaram as universidades e os centros de pesquisa. Esperamos que isso seja revertido, porque uma infraestrutura como a que nós temos é boa, no momento, importante, mas ela vai ficando desgastada se não tivermos manutenção. Então vai ser muito importante que esses tempos sombrios que nós estamos vivendo hoje sejam vencidos e que as universidades e instituições de pesquisa voltem a ser apoiadas como foram nos governos do presidente Lula (2003-2011) e da presidenta Dilma (2011-2016).
OBSV) Você é um dos coordenadores do Comitê Científico de Combate ao Coronavírus no Nordeste. Meses após a criação da entidade, já é possível medir o impacto nas ações adotadas pelos estados da região no combate à Covid?
S.R: - Certamente é possível medir os impactos por alguns indicadores muito concretos. Nós sabemos perfeitamente que os estados da Região Nordeste têm uma situação de desigualdade social muito grande, uma renda per capita das menores do Brasil e populações que vivem em situação de muita dificuldade, aglomeradas, mas, mesmo assim, o número de óbitos desses estados não é dos maiores. Os maiores no momento são São Paulo, que é um estado desenvolvido, Rio de Janeiro, o estado de Minas Gerais, que está tendo um número de mortes cada vez maior… Então nós atribuímos a reação [positiva] que os governos do Nordeste estão tendo para combater esse vírus em grande parte porque estamos estudando muitas questões envolvidas na pandemia com especialista não só da Região, mas também do Brasil e de fora do país, e porque nós estamos regularmente fazendo recomendações aos governadores, que felizmente estão seguindo-as. Os estados do Nordeste foram um dos primeiros a decretar o confinamento social, que é a forma mais importante que se tem no momento para evitar a proliferação do vírus. Então nós acreditamos que, apesar das dificuldades, o resultado do trabalho do nosso Comitê é bastante alentador.
OBSV) Na sua visão, o que justifica o decréscimo nas taxas de mortes e novos casos de Covid-19 em Pernambuco, tendo em vista a reabertura das atividades desde os últimos meses? É possível afirmar que chegamos no estágio de imunidade de rebanho?
S.R: - É uma característica conhecida de todas epidemias que, na fase inicial, quando tem pouca gente contaminada e tem muita gente a ser contaminada, o espalhamento do vírus é muito grande. Esse vírus é transmitido pelo contato entre as pessoas, pelo contato pessoal, direto, ou pela transmissão de gotículas que saem quando a gente espirra, tosse, e estão contaminadas. Então, na fase inicial, tem muita gente para ser contaminada e o crescimento é rápido. A doença chega num pico ou num platô e depois, à medida que o número de pessoas contaminadas vai aumentando, o número de pessoas possíveis de serem contaminadas vai diminuindo. Na nossa visão, nós ainda não chegamos no estágio de imunidade coletiva, porque isso só acontece quando cerca de 70 a 80% da população ou já foi infectada, ou já foi vacinada, ou é imune, e nós não chegamos ainda nessa taxa. Mesmo com a reabertura das atividades nos últimos meses, nós já temos um número de pessoas que foram infectadas muito grande, então a tendência é de decréscimo no número de casos e mortes. Mas ainda faltam alguns meses, nós não sabemos quanto, para chegar numa situação em que a doença deixou de ser epidêmica. Ela não vai desaparecer, mas vai, cada vez mais, atingir um número menor de pessoas.
OBSV) Quando falamos de uma pandemia - e com números tão alarmantes feito essa - é difícil precisar o futuro. Mas, puxando para o lado da vacina, e de acordo com as últimas notícias que têm acompanhado, é possível prever/ter esperança de que ela esteja disponível até o final do ano aqui no Brasil?
S.R: - Como a pergunta mesmo foi feita, é difícil precisar o futuro, mas estou percebendo, pelo que acessamos no nosso Comitê e vemos de informação da televisão, dos jornais, da mídia, todos os dias, que nós não teremos vacina disponível para a população até o final deste ano. Algumas pessoas muito otimistas falam nessa possibilidade, mas nós achamos que esse não é o caso porque as vacinas que já estão sendo testadas na fase três começaram a fazer os testes há pouco tempo. E, para que ela esteja disponível para ser usada em grande massa na população, é preciso testar não só milhares de pessoas, mas durante um certo tempo de vários meses para se ter uma avaliação dos resultados, não só da imunidade que as pessoas adquiriram com a vacina, mas também das reações adversas. Então, a expectativa é que ela estará disponível no início do próximo ano. Alguns especialistas falam no segundo semestre do próximo ano, mas dificilmente ela estará disponível aqui no Brasil ainda esse ano ou em qualquer lugar o mundo ainda esse ano.