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Familiares de vítimas de acidentes aéreos encontram alívio na busca da compreensão da dor/perda

Para a tese, foi realizada investigação e estudo de caso diante do acidente do voo Noar 4896, em 2011

Por Ellen Tavares

Acidentes aéreos não acontecem frequentemente. No entanto, quando acontecem, a repercussão social ultrapassa fronteiras e afeta emocionalmente um amplo número de pessoas, que vai muito além dos que estão envolvidos diretamente com a tragédia. Por ser o segundo país do mundo com o maior número de aeronaves, contando 21.895 modelos civis regularmente registradas, o Brasil, do mesmo modo que apresentou nos últimos anos um crescimento significativo no aumento do tráfego aéreo, também registrou um aumento em relação à preocupação com a segurança dos voos, visto que os desastres aéreos desencadeiam sofrimento psíquico não só para as pessoas vítimas diretas, mas também para toda a sociedade.

Pensando no impacto de acidentes dessa natureza suficientemente intensos que provocam danos à saúde mental, a pesquisadora Maria da Conceição Pereira Sougey apresentou a tese de doutorado "Impacto tardio na saúde mental nos familiares de vítimas de Acidente Aeronáutico: O caso NOAR voo 4896", no Programa de Pós-Graduação em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento do Centro de Ciências da Saúde da UFPE. Conceição tem 20 anos de atividades como psicóloga na aviação, especialmente como investigadora de análises de contribuições do fator humano psicológico em acidentes ocorridos no Nordeste do Brasil.

A tese buscou avaliar o impacto tardio e as condições de saúde mental nos familiares de vítimas de acidentes aéreos, realizando uma investigação e estudo de caso diante do acidente do voo Noar 4896, que seria realizado entre Recife, Natal e Mossoró, em 2011, quando foram afetadas por perda e luto 16 famílias da Região Nordeste do país. Após três minutos da decolagem do Aeroporto Internacional do Recife/Guararapes – Gilberto Freyre, a aeronave colidiu com o solo entre uma área residencial, à beira-mar, não se tornando uma tragédia de maiores proporções pelo fato de ter caído sobre um terreno baldio. Todos os 14 passageiros e os dois tripulantes do avião foram vitimados por morte instantânea com a queda brusca do avião. O acidente fez a empresa aérea envolvida a colocar em prática o Plano de Assistência às Vítimas de Acidentes Aeronáuticos e Apoio aos seus Familiares.

Segundo a pesquisadora, um acidente aeronáutico instala uma crise e, na instauração de uma crise, há sempre situações novas e desconcertantes que podem dar lugar a uma condição de sentimento de impotência ante o impacto vivido. "A experiência da perda em evento traumático, como o de um acidente aéreo, arruína a sensação de segurança e confiança, acarretando um sofrimento que pode assumir manifestações de adoecimento em longo prazo, como o estresse pós-traumático, e transições para condições de depressão, com risco de suicídio", afirma a pesquisadora. Ela acrescenta: "Melhorar a compreensão da dor e do sofrimento pode oferecer subsídios  e re-significados para as condições da perda, e o atendimento psicológico e psiquiátrico imediato pós um evento traumático permitirá possibilidades de prevenção à saúde mental dessas pessoas."

Segundo a pesquisa, a ser humano tem capacidade de adaptação e de buscar resiliência frente às mais diversas situações, porém as experiências traumáticas podem alterar o equilíbrio psicológico, biológico, socioeconômico e desencadear  psicopatologias pela incapacidade de ultrapassar esses eventos de forma adaptativa e criativa. No estudo, a pesquisadora observou que em traumas provocado diante de um desastre, as reações são muito variáveis, e não é possível fazer previsões sobre o tempo que as pessoas traumatizadas vão levar para se recuperar ou até mesmo para apresentar sintomas ou transtornos mentais decorrentes dessas vivências. "Há fatores específicos de cada individuo que podem contribuir ou impedir a recuperação dessas pessoas", explica.

"Em casos assim, o melhor caminho é oferecer espaço para a dor ser expressa, abrir espaços interpretativos onde as pessoas traumatizadas melhor processem suas experiências de dor e não encontrem o caminho para o adoecimento, considerando também a importância do apoio psicológico, médico psiquiátrico, social e econômico dirigido a essas condições que exigem cuidados especiais", aponta a psicóloga.

ACIDENTES | De 2006 a 2015, segundo o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), aconteceram, no Brasil, quatro grandes acidentes aeronáuticos dentro do segmento da aviação comercial: o do voo 1907, no Amazonas; o do voo 3054, em São Paulo; o do voo 447, no Oceano Atlântico e o do voo 4869, no Recife. Todos considerados acidentes de grande porte, que tiveram forte impacto na sociedade brasileira e mundial. 

Mais informações

Programa de Pós-Graduação em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento da UFPE
(81) 2126.8539
posneuro@ufpe.br

Maria da Conceição Pereira Sougey
concepereira@uol.com.br

Data da última modificação: 21/02/2018, 14:21