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A questão da autonomia

Por Anísio Brasileiro, Reitor da UFPE.

Iniciamos, em outubro, uma nova etapa da nossa gestão como reitor da UFPE. Nesse segundo mandato, agora ao lado da vice­reitora Florisbela Campos, novos desafios deverão ser enfrentados. Entre eles, a discussão do sentido da universidade pública brasileira e o de sua autonomia. No texto “Por que as universidades?”, Umberto Eco afirma que elas representam o espaço onde todos falam a mesma língua. E, por isso, os problemas nelas debatidos ultrapassam fronteiras.

Universidades são comunidades culturais, com regras próprias, como a geração do conhecimento, culto ao mérito, qualidade da formação ética e profissional, pluralidade de olhares sobre o mundo diverso, além da defesa da democracia e dos direitos. São, também, lugares do pensamento crítico, da reflexão, das polêmicas e dos debates. Territórios do respeito às diferenças e da livre expressão, sem contestação do princípio da autoridade institucional, embora este jamais se confunda com o autoritarismo.

Esses elementos caracterizam a autonomia universitária, o que não significa que tais instituições pairem acima da Lei, dos organismos de tutela e das suas responsabilidades acadêmicas e sociais. Universidades são impulsionadoras do desenvolvimento, que respondem a demandas concretas da sociedade, mas também se colocam à sua frente, abrindo fronteiras do conhecimento, com inovação e criatividade. No caso da UFPE e das demais universidades públicas brasileiras, somos instituições do Estado, por ele financiadas para o benefício do país. O financiamento público é a base de sustentação da autonomia, que permite que a universidade pense, ouse e arrisque­se de maneira livre – ainda que, nos dias de hoje, há que se considerar igualmente outras formas de financiamento oriundas do setor privado e de organizações sociais.

A partir das reflexões do sociólogo Pierre Bourdieu, compreendemos que a autonomia universitária se expressa na ideia de campo científico, no qual se inserem atores e instituições que primam pelo mérito, pela avaliação por pares, pelo concurso público, pela carreira baseada no desempenho acadêmico. Esse campo está sujeito a lutas entre atores, pois é um "lugar de relações de força". Nas universidades se expressam desde os que as veem como espaço de lutas puramente sindicais – com viés fortemente ideológico e partidário, visão que refutamos com veemência – até os que as enxergam como oportunidades de negócios econômicos desconectados da sociedade – dos quais nos afastamos também. Associamo­nos ao pensamento de Boaventura de Souza Santos, para quem a universidade “liga o presente ao médio e longo prazo pelos conhecimentos e pela formação que produz e pelo espaço público privilegiado de discussão aberta e crítica que constitui”. Como bem público, o patrimônio universitário precisa ser preservado e valorizado. Um projeto de país inclusivo e soberano mede­se também pela importância que se concede à universidade nas políticas públicas.

Publicado no Jornal do Commercio em 28 de novembro de 2015

 

Date of last modification: 27/10/2016, 14:14

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